O medo da cidade

Muitos portugueses têm pavor das cidades. Ah, se vivêssemos todos no campo... Mesmo quem não pode viver numa aldeia sonha em afastar-se o mais possível do centro da cidade, para fugir da “poluição”, da “confusão” e da “solidão” – o ideal de vida é, muitas vezes, uma vivenda num qualquer canto sossegado.

Vamos lá contrariar um pouco essa ideia.

Para começar, pasme-se, a cidade é uma forma particularmente ecológica de organizar a vida humana. Imaginem dois grupos de 300 pessoas (umas 100 famílias). O primeiro grupo vive em 100 vivendas. O segundo num prédio, no centro da cidade. Se pensarmos em todas as implicações, será fácil perceber que as 100 famílias do prédio podem levar uma vida mais “amiga do ambiente”. Ou seja, apesar de o espaço entre as vivendas disfarçar o estrago, 300 pessoas em vivendas poluem mais do que 300 pessoas num prédio.

Depois, temos a ideia da solidão. Não nego que haja solidão nas cidades, principalmente no caso dos idosos, mas, em geral, é tão ou mais fácil criar relações humanas livres do que numa aldeia – afinal, ao escolhermos os nossos amigos, estamos a escolher a nossa aldeia particular.

Ou seja: a concentração humana não é necessariamente má. Lisboa tem muito trânsito não porque tenha muita gente, mas porque a maioria das pessoas que trabalha em Lisboa vive longe. Uma cidade com muitas pessoas tem mais oferta de serviços, mais oferta cultural e mais oportunidades. No entanto, o ódio à cidade acaba por prejudicar aquilo que as cidades têm de bom, ao ajudar a empurrar os “urbanos relutantes” que são os portugueses para a periferia, com medo dos males imaginários do centro.

Esta ideologia anti-urbana também leva algumas pessoas a não gostar do Parque das Nações. Diz-se que tem muitos prédios e muita gente. Depois, misturam-se alguns mitos: não tem espaços verdes, é um gueto, é um subúrbio... Ora, o Parque tem dos melhores espaços verdes de Lisboa, é um bairro aberto e visitado por milhões – e quanto ao subúrbio, para dizer tal coisa é preciso não saber o que é um subúrbio. Afinal, o Parque das Nações é o melhor exemplo que o país tem dum centro urbano: junta habitação, emprego e ofertas variadas num espaço relativamente reduzido, que atrai moradores, empresas e visitantes e permite criar uma verdadeira vida urbana.

O que vos proponho é que vejam para lá das ideias-feitas que nos limitam a vida. A todos os que insistem no “horror” que é Lisboa, digo: nestes dias de sol, atrevam-se a sair e ver a cidade com outros olhos.

Publicado em Notícias do Parque
Abril de 2011

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